15.11.08

A hospitalidade e o respeito

A Parashá desta semana, Vaierá, mostra-nos a força espiritual descomunal de Avraham Avinu. Apesar de ter feito um doloroso Brit-Milá aos 99 anos, sem nenhum tipo de anestesia, todo o seu pensamento estava apenas concentrado em fazer bondades aos outros. Mesmo doente, ele insistia em receber convidados na sua casa. Mas os planos de D'us eram outros, pois Ele queria que Avraham descansasse para poder recuperar. D'us fez com que o dia se tornasse insuportavelmente quente, a ponto de nenhum viajante se aventurar a sair de casa. Vendo que estranhamente não passava nenhum visitante, Avraham mandou o seu servo Eliezer procurar viajantes no caminho, mas ele não encontrou ninguém. Avraham não desistiu e mesmo com terríveis dores foi para a porta de casa, na esperança de encontrar viajantes no caminho. D'us entendeu, que Avraham sofria mais em não receber convidados do que as terríveis dores do Brit-Milá e por isso mandou-lhe 3 anjos disfarçados de beduínos, para que Avraham pudesse cumprir a Mitzvá de Achnassat Orchim (receber convidados).
A Parashá descreve todo o esforço de Avraham para agradar aos beduínos e recebê-los da melhor forma possível. Ofereceu-lhes comida, bebida e descanso na sombra. E tudo o que Avraham ofereceu aos beduínos, ofereceu com abundância. Serviu leite e manteiga, pão, bolos e carne à vontade. Mas há algo estranho, porque quando ele ofereceu água para que lavassem os pés, ofereceu pouco, como está escrito "Que seja trazido um pouco de água..." (Bereshit 18:4). Porquê? Será que Avraham não queria gastar muito com os convidados pois era uma pessoa económica?
Os nossos sábios ensinam justamente o contrário, que Avraham não media gastos para receber bem os seus convidados. Por exemplo, o Talmud conta que Avraham não preparou apenas um boi para servir aos visitante, e sim três bois. Mas porque três bois para apenas três pessoas? Rashi, comentarista da Torá, explica que Avraham quis servir para cada um dos viajantes um prato típico de reis: língua com mostarda, uma língua para cada beduíno. Portanto, se Avraham era uma pessoa tão generosa, porque ofereceu pouca água?
Explica o livro "Lekach Tov" que nem todas as coisas foi Avraham quem as trouxe sózinho. O leite e a manteiga, os bolos e a carne foram trazidos por ele, mas a água Avraham preferiu pedir ao seu filho Ishmael para a trazer, não por preguiça, e sim como uma forma de ensiná-lo a importância de fazer Chessed (bondade).
Podemos ver a grandeza de Avraham não apenas nos seus actos de Chessed, mas também na sua preocupação com os outros. O que Avraham fazia sózinho, fazia o melhor possível e esforçava-se ao máximo, e por isso trouxe com abundância. Mas o que ele pedia aos outros, era cuidadoso para não sobrecarregá-los. Por isso Avraham pediu a Ishmael apenas um pouco de água. Avraham era muito Tzadik, mas não queria que os seus bons actos fossem construídos sobre o esforço dos outros.. E isso devemos nós aprender, se queremos fazer bons actos, que façamos com o nosso esforço e não sobrecarregando outras pessoas. Assim ensina-nos o Pirkei Avót (Ética dos Patriarcas): "Todo aquele com quem as pessoas estão contentes, D'us também o fica; e todo aquele com quem as pessoas não estão contentes, D'us também não fica" (Avót 3:10). Por outras palavras, de nada adianta fazer bons actos à custa de outras pessoas, pois se elas não estiverem contentes connosco, D'us também não estará.
Há um outro ensinamento importante que aprendemos dos actos de Avraham Avinu. Somos extremamente rigorosos com os outros, constantemente questionamos os actos das outras pessoas e esperamos que todos se comportem de maneira perfeita e exemplar. Mas ao contrário, quando se trata de nós mesmos, despreocupamo-nos e estamos sempre em busca de justificação para os nossos actos. Avraham ensinou-nos o contrário, a ser rigorosos connosco, melhorando para chegar á perfeição, porém ao mesmo tempo também nos preocuparmos com os outros, respeitando os limites de cada um. Desta forma não apenas as outras pessoas estarão contentes connosco, mas D'us também estará.

"Sempe, que apontamos o dedo a alguém, 3 dedos ficam apontados para nós mesmos"