20.10.07

BONDADE acima de tudo

"O pequeno garoto entrou sozinho no restaurante e sentou-se na única mesa vaga. A empregada não deu muita atenção, e demorou vários minutos para atendê-lo. Quando finalmente chegou á sua mesa, não escondeu o seu desprezo pelo garoto. Ele nem quis ver o cardápio, apenas perguntou, com um brilho nos olhos:
- Quanto custa o sundae de chocolate?
- 3 reais – respondeu, mal humorada, a empregada.
O pequeno garoto tirou do bolso um monte de pequenas moedas e começou a contar. Virou-se então para a empregada e perguntou:
- E um bola de sorvete no prato, quanto custa?
- 2 reais e cinquenta centavos – respondeu rispidamente a impaciente empregada, vendo que havia clientes esperando pela mesa, e aquele garoto, que não tinha nem mesmo dinheiro para o Sundae, estava atrapalhando o sistema.
O garoto mais uma vez contou as suas moedinhas, pensou por alguns momentos e finalmente pediu o sorvete no prato. A empregada trouxe o sorvete e colocou-o na mesa, dando claras demonstrações de que não estava contente com a presença do garoto. Ele tomou o sorvete, levantou-se, deixou as moedinhas na mesa e saiu. Quando a empregada voltou e contou as moedinhas, uma lágrima correu pelos seus olhos. O garoto havia deixado na mesa 3 reais, dois e cinqüenta pelo sorvete, e cinqüenta centavos de gorjeta. Aquele garoto, mesmo estando com vontade de comer o sundae, decidiu tomar o sorvete mais barato apenas para poder deixar para a empregada a gorjeta. E ela o havia tratado tão mal…"
Temos duas escolhas na vida: se conformar que existem poucas pessoas boas no mundo, e desistir de ser uma boa pessoa; ou decidir que o comportamento dos outros não vai nos influenciar e nos tornar pessoas piores.

-------------------------------------

Nesta semana lemos a Parashá Lech Lechá, que nos ajuda a conhecer um pouco mais da grandeza de Avraham Avinu, um dos pilares do judaísmo que literalmente mudou o mundo. D'us o testou com 10 testes muito difíceis, deste ter que sair da tranqüilidade da sua casa e da sua família para ir a uma terra estranha, até ser comandado a sacrificar o seu filho Itzchak. Avraham venceu todos os testes por causa de sua Emuná (fé) inabalável no Criador do universo. Mas será que Avraham sempre teve esse nível tão elevado de Emuná e conexão com D'us?
Ensina-nos o Rambam (Maimônides) que Avraham nasceu numa época em que todos faziam idolatria, e o seu pai, Terach, tinha uma loja onde eram vendidos ídolos. Foi neste ambiente que Avraham cresceu e foi educado, e no começo da sua vida ele também chegou a fazer idolatria. Porém, desde muito jovem ele já havia começado a se questionar sobre a validade daqueles deuses de pedra e de madeira. Ele pensava, dia e noite, como poderia um mundo tão perfeito, tão complexo e ao mesmo tempo tão harmónico, funcionar sem alguém que o conduzisse. E ele persistiu nesta busca até que ele encontrou a verdade: que realmente existia um Criador, que havia criado e controlava o universo inteiro.
Mas Avraham foi o único na história do mundo que buscou a verdade, o único questionador? Certamente que não. O mundo conheceu grandes génios pensadores, que também buscaram a verdade. Então porque somente Avraham conseguiu ir até o fim, até a verdade absoluta, o que nenhum outro conseguiu? Pois em geral, quando as pessoas procuram respostas e não as encontram imediatamente, elas desistem. Avraham não encontrou respostas imediatamente. Ele passou 45 anos refletindo, pensando, trabalhando as suas idéias e resolvendo os seus conflitos internos até que conseguiu chegar no total reconhecimento do Criador. Porque ele não desistiu no meio do caminho, como todos os outros? Explicam os nossos sábios que o que lhe deu forças para continuar na busca da verdade até ao fim foi o seu coração bondoso. O que isto significa?
Imagine se uma pessoa se perdesse no deserto e ficasse dias vagueando, sem água e sem comida. Já no limite das suas forças, ela cai, desmaiada, e quando acorda vê uma mesa posta, repleta de comidas e bebidas deliciosas, que ela come de forma desesperada. Ela olha em volta, procurando o benfeitor, mas não vê ninguém. Quando chega a noite ela dorme, e quando acorda a mesma coisa se repete: todo o lixo estava limpo, e a mesa estava novamente posta, com comidas e bebidas para um rei. A mesma coisa repete-se muitas outras vezes, até que ele consegue ter forças para novamente atravessar o deserto e voltar para casa, são e salvo. Será que esta pessoa não buscaria, por todos os dias da sua vida, saber quem foi o benfeitor que havia salvo a sua vida e feito tantas bondades, para pelo menos poder agradecer-lhe?
Avraham observou o sol e percebeu quanta luz e calor chegavam no mundo, sem que o sol recebesse nenhum pagamento. Olhou para a lua e para as estrelas e observou como elas iluminavam e orientavam os viajantes nocturnos, sem receber nada em troca. E começou a perceber que todo o universo havia sido construído pelo Criador apenas para nos fazer bem, constantemente, sem receber absolutamente nada em troca. E o seu coração bondoso não o deixou desistir de buscar quem era aquele Criador que fazia tantas bondades, para poder ao menos agradecê-Lo.
Vemos actualmente que muitos da elite intelectual do mundo se recusam a acreditar que o mundo tem um Criador, apesar de tantas evidências lógicas que existem. Porquê? Pois aceitar que existe um Criador implica em reconhecer que recebemos Dele coisas boas, criando automaticamente uma dívida de gratidão, e as pessoas preferem não se sentir endividadas. A grande virtude de Avraham foi vencer o seu egoísmo, e procurar, até ao fim, Aquele Quem nos faz bondades ilimitadas 24 horas por dia. E essa é a nossa escolha: viver num mundinho egoísta e fechado, ou abrir os nossos horizontes e observar, que existe uma verdade muito maior do que a que conhecemos.

Rav. Efraim Birbojm