9.8.08

O dia de Tishá BeÁv

Shavua Tov! Qual o dia mais triste da vida de uma pessoa? Provavelmente é o dia do falecimento de um parente mais próximo (pai, mãe, irmão, irmã, filho, filha ou cônjuge). E se a pessoa não sente nenhuma tristeza pelo falecimento de seu parente próximo? Então certamente deveria se sentir triste por sua falta de apreço e por sua incapacidade de sentir a emoção apropriada.
Dia 9 de agosto, sábado, iniciando-se ao pôr do sol, até o anoitecer de domingo, é Tishá BeÁv, o 9o. Dia do mês Judaico de Av (Em S. Paulo, o jejum se inicia às 17:47 hs de sábado e se encerra às 18:17 hs de domingo). É o dia mais triste do calendário Judaico. O que a pessoa deve fazer se não tem nenhum sentimento em especial por Tishá BeÁv? Se for Judia e se se identifica com o Judaísmo, então lhe cabe descobrir o porquê de nós, como um Povo, estarmos de luto neste dia. O que perdemos nesta data? O que ela significa para nós? O que devemos fazer para recuperar o que perdemos? No mínimo deveríamos sentir muito pelo fato de não sentirmos nenhum pesar nesta data.
Em 1967, pára-quedistas israelenses capturaram a Cidade Velha de Jerusalém e abriram caminho até o Muro das Lamentações (Kotel HaMaaravi - www.aish.com/wallcam/). Muitos dos soldados religiosos estavam tomados de emoção e encostaram-se no Muro, orando e chorando. Um pouco afastado do Muro estava um soldado não-religioso que também estava chorando. Seus colegas perguntaram: “Por que você está chorando?
O que o Muro representa para você?” O soldado respondeu: “Estou chorando por não saber por que deveria estar chorando!”
O dia de Tishá BeÁv é observado para lamentarmos a perda dos Templos Sagrados de Jerusalém. Qual foi a grande perda resultante da destruição dos Templos? Foi a perda do sentimento da presença Divina entre nós. O Templo era um local de orações, espiritualidade, santidade e milagres a céu aberto. Era a parte mais importante do Povo Judeu, o ponto focal da identidade Judaica. Três vezes ao ano (Pessach, Shavuót e Sucót) todo Judeu ascendia ao Templo. Sua presença permeava todos os aspectos da vida Judaica: o planejamento do ano, o lado para onde a pessoa se voltava para rezar, onde recorria por justiça ou para estudar Torá, onde trazia certos dízimos, etc.
Neste mesmo dia, através da História, muitas tragédias aconteceram com o Povo Judeu, incluindo:
1. O incidente com os espiões difamando a Terra de Israel, com o conseqüente decreto para vagarem pelo deserto por 40 anos.
2. A destruição do Primeiro Templo, em Jerusalém, por Nevuchadnétzar, Rei da Babilônia.
3. A destruição do Segundo Templo, em Jerusalém, pelos romanos, no ano 70 E.C.
4. A queda da cidade de Betar e o fim da revolta de Bar Kochvá contra os romanos, 62 anos depois, no ano 132 E. C.
5. Os Judeus da Inglaterra são expulsos em 1290.
6. Iniciam-se as Primeiras Cruzadas. Dezenas de milhares de Judeus são mortos e muitas comunidades completamente destruídas.
7. Os Judeus da Espanha são expulsos em 1492, dando início à Inquisição Espanhola.
8. A Primeira Guerra Mundial irrompeu em Tishá BeÁv de 1914, quando a Rússia declarou guerra contra a Alemanha. O ressentimento alemão após ter sido derrotado criou o palco para o Holocausto.
9. Começou a deportação dos Judeus do Gueto de Varsóvia.

Tishá BeÁv é um dia de jejum (com a mesma duração que Yom Kipur: do anoitecer de um dia até o anoitecer do dia seguinte) que culmina e encerra as Três Semanas de luto do Povo Judeu. Neste dia somos proibidos de comer e beber, banhar-nos, usar cremes, loções ou óleos, calçar sapatos de couro ou manter relações conjugais. A idéia é minimizar o prazer e fazer o corpo sentir o desconforto que a alma deveria sentir em
relação a tragédias como estas. Como em todos os dias de jejum, o objetivo deste dia é a introspecção, fazendo um balanço espiritual e corrigindo nossos caminhos – o que em Hebraico é chamado Teshuvá, o retorno para o caminho do bem e da honra. Os Tefilin são colocados somente na parte da tarde, após as 13:00 hs.
Teshuvá é um processo de quatro etapas:
1) Precisamos nos conscientizar das coisas erradas que fizemos e nos arrepender de tê-las feito.
2) Precisamos parar de fazer estas transgressões e corrigir quaisquer danos que possamos ter causado.
3) Devemos aceitar sobre nós não repetir o erro novamente.
4) Precisamos, verbalmente, pedir ao Todo-Poderoso que nos desculpe.
Na noite de Tishá BeÁv, lemos na sinagoga a Meguilá Eichá (pronuncia-se Eirrá), o livro das Lamentações, escrito pelo profeta Yirmiáhu (Jeremias). Também recitamos as Kinót, poemas especiais recontando as tragédias que aconteceram com o Povo Judeu durante toda a História. Com o ambiente à meia luz, sentamo-nos em almofadas ou pequenas banquetas em sinal de luto.
O estudo da Torá é o coração, a alma e o sangue do Povo Judeu. É o segredo de nossa sobrevivência.
Estudar leva ao entendimento e o entendimento leva à ação. Uma pessoa não consegue amar aquilo que não entende. Estudar Torá nos dá uma grande satisfação ao nos proporcionar a oportunidade de entendermos nossas vidas. Em Tishá BeÁv somos proibidos de estudar Torá, com exceção daquelas partes que tratam sobre as calamidades que o Povo Judeu tem sofrido. Precisamos parar, refletir, mudar a nós mesmos e, somente assim, estaremos aptos a fazer deste um mundo melhor.
Durante toda a nossa História passamos por Holocaustos, Pogroms, Cruzadas e outros massacres. Isto por si só já nos faria despertar a seguinte pergunta: “Por que nossos ancestrais tão persistentemente insistiram em se manter Judeus quando, com poucas palavras, poderiam ter se convertido – exceto durante o Holocausto – e salvado suas vidas e a de seus familiares? O que eles sabiam que não sabemos? O que precisamos então saber?”
Repetindo a história que compartilhei com vocês há algumas semanas atrás, o imperador francês Napoleão Bonaparte estava andando pelas ruas de Paris e ouviu lamentos e gritos vindos de uma sinagoga.
Querendo saber o motivo, vieram lhe informar que aquele era o dia de Tishá BeÁv e que os Judeus estavam chorando pela destruição de seu Templo em Jerusalém. “Como eu não ouvi sobre isto? Quando aconteceu?”, perguntou Napoleão. Quando descobriu que o fato ocorrera há quase 2.000 anos, Napoleão permaneceu em silêncio e então falou: “Uma nação que recorda seu Templo destruído e lamenta tão profundamente e por tanto tempo sua perda, certamente terá o mérito de tê-lo reconstruído novamente!” Que todos nós possamos ter o mérito de que o Grande Templo seja reconstruído rapidamente em nossos dias!