29.7.08

O DONO DA CASA ESCOLHE QUEM ENTRA

Um jovem rapaz estava com problemas. Ele tinha muitos pensamentos impuros, e não havia como evitá-los, por mais que tentasse impedi-los de entrar na sua cabeça. Preocupado e sem saber como resolver, foi-se aconselhar com o seu rabino. O rabino escutou atentamente e indicou que ele fosse falar com um grande rabino que vivia numa cidade vizinha.

O jovem partiu imediatamente, e após uma longa e cansativa viagem, chegou á casa do grande rabino. Já era de noite, e estava muito cansado. Notou que havia gente em casa, pois viu luzes acesas, mas estranhou que, apesar das suas insistentes batidas na porta, ninguém abriu. Continuou batendo por muito tempo até que, exausto, desistiu e dormiu ali mesmo, sentado na porta de entrada.

Logo de manhã cedo o rabino veio até a porta, acordou o rapaz e convidou-o a entrar e tomar o pequeno-almoço. O rapaz agradeceu, mas perguntou porque o rabino não havia aberto a porta de noite, já que ele havia insistido e batido tantas vezes. O rabino deu-lhe uma palmada carinhosa nas costas e explicou:

- Vieste aconselhar-te comigo sobre os teus maus pensamentos, acreditando ser impossível evitar que eles entrem na tua cabeça. Então eu quis ensinar-te uma lição, para que nunca mais te esqueças:
- quando se é realmente o dono da casa, temos a oportunidade de escolher quem entra e quem não entra, independente de quanto ele insista.
O mesmo acontece com a tua cabeça. Precisas de trabalhar o teu auto-controle até que te tornes o dono dela, e então poderás facilmente escolher o que entra e o que fica de fora.
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A Parashá desta semana, Matot, ensina-nos sobre as leis referentes às promessas e juramentos que uma pessoa pode voluntariamente fazer, para se proibir de algo que é permitido (por exemplo, a pessoa promete que por 30 dias não comerá maçãs), ou para se obrigar a fazer algo que não era obrigada (por exemplo, a pessoa promete dar um donativo para a sinagoga). Mas a Torá ressalta que a pessoa deve ser muito cuidadosa ao fazer uma promessa, pois não cumpri-la é muito grave. E uma das leis que a Parashá ensina é que se uma menina de até doze anos e meio e que ainda vive sob os cuidados do pai faz uma promessa, o pai deve aprovar esta promessa, e caso não aprove, ele tem o poder de cancelá-la, como está dito no versículo "Mas e se impedir o seu pai no dia em que escutou, todas as promessas e abstinências a que ela se obrigou não se afirmarão, e D'us a perdoará, pois o seu pai a impediu" (Bamidbar 30:6). Mas há uma dificuldade neste versículo, pois a que se refere "e D'us a perdoará"? A menina fez alguma transgressão?

Explica Rashi, comentarista da Torá, que o versículo refere-se a uma menina que fez uma promessa e a quebrou, mas no momento em que ela a quebrou, a promessa já havia sido revogada pelo pai, sem o conhecimento da filha. Quando a filha quebrou a promessa, ela ainda pensava que a promessa era válida, e por isso precisa de ser perdoada por D'us. Mas a pergunta continua, pois se a promessa já havia sido revogada pelo pai, na prática ela não transgrediu nada. Então por que ela precisa de ser perdoada?

A resposta desta pergunta é um importante fundamento no judaísmo: não apenas os maus actos são considerados uma transgressão, mas também os maus pensamentos. E isso é uma grande "novidade" para muitos, pois a maioria das pessoas acha que não há nenhum problema em ter maus pensamentos. Por exemplo, o que há de mal se um homem casado deseja nos seus pensamentos uma outra mulher? Afinal, ele não fez nada de errado!

Em primeiro lugar, o que olhamos e o que pensamos nos influência muito mais do que nós imaginamos. Explica o rabino Isroel Meir HaCohen, mais conhecido como Chafetz Chaim, que o caráter do ser humano é construído através do que ele vê e o que ele escuta. O que isto significa? Que apesar de cada ser humano ter a sua própria natureza e suas inclinações naturais, o principal factor na sua formação são os sentidos, principalmente a visão e a audição, e através deles nós absorvemos tudo o que está ao nosso redor. Portanto, as más influências levam a maus pensamentos, e maus pensamentos levam a maus actos. Devemos cortar o problema pela raiz, pois nenhuma traição ocorre sem antes passar por dezenas ou centenas de pensamentos impuros.

Em segundo lugar, um acto que a pessoa não sente a gravidade é muito pior, pois ela não se arrepende. Quando uma pessoa comete um acto de traição, ela sente-se culpada, ela sente o peso do seu mau acto, e está propensa a se arrepender e a não voltar a pecar. Mas apesar dos maus pensamentos também serem uma transgressão, como nos ensina o versículo "Não siga atrás do seu coração e atrás dos seus olhos", a maioria das pessoas não entende que é um erro e não se arrepende, tornando a transgressão em pensamento muito mais grave do que o acto.

Mas os pensamentos são algo tão natural, será que é possível controlá-los?
A resposta é sim.
A Torá não foi entregue aos anjos, e sim a seres humanos, e portanto tudo o que está contido nela está ao nosso alcance. Então qual a fórmula para chegar ao controle dos pensamentos? O início do controle dos pensamentos está no controle dos nossos sentidos, o controle do que queremos que seja absorvido. Colhemos o que plantamos, isto é, o nosso pensamento é fruto do que nós permitimos ver e ouvir. Pois se um poço for enchido com água, ele fornecerá água. Mas se um poço for enchido com lixo, ele fornecerá apenas lixo.