29.12.07

O MILHO BOM


Esta é a história de um agricultor, que sempre vencia o prémio "milho-crescido". Todos os anos entrava com o seu milho no concurso e ganhava o maior prémio.Uma vez um repórter do jornal entrevistou-o e perguntou como ele cultivava o milho para sempre ser o vencedor. O agricultor contou que o segredo era compartilhar a semente do milho bom com os seus vizinhos. Mas o repórter não entendeu, e perguntou:
- Como pode compartilhar a sua melhor semente de milho com os seus vizinhos, quando eles estão a competir com o seu todos os anos?
- Vou te explicar - disse o fazendeiro - O vento apanha o pólen do milho maduro e o leva de campo para campo. Se os meus vizinhos cultivam milho inferior, a polinização degradará continuamente a qualidade do meu milho. Se eu quiser cultivar milho bom, eu tenho que ajudar os meus vizinhos a também cultivar milho bom.
Ele era atento às conectividades da vida. Ele sabia que o milho dele não poderia melhorar a menos que o milho do vizinho também melhorasse.
Assim acontece também em outras dimensões. Aqueles que querem estar em paz devem fazer com que os seus vizinhos estejam em paz. Aqueles que querem viver bem têm que ajudar os outros para que vivam bem. E aqueles que querem ser felizes têm que ajudar os outros a achar a felicidade, pois o bem-estar de cada um está ligado ao bem-estar de todos.
A lição que fica para cada um de nós: se queremos cultivar milho bom, nós temos que ajudar os nossos vizinhos a também cultivar milho bom.
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Nesta semana começamos o segundo livro da Torá, Shemot, que descreve a escravidão do povo judeu no Egipto e a redenção milagrosa de D'us, com as 10 pragas e a abertura do mar Vermelho, sob o comando de Moshé Rabeinu. E a Parashá desta semana, Shemot, descreve a característica que fez de Moshé ser um líder tão grande: a preocupação com o próximo.
Mesmo tendo sido criado na casa do Faraó, com todo o conforto e abundância, ele não esqueceu os seus irmãos e o sofrimento deles, e constantemente saía para ver como estavam.
Numa destas vezes, Moshé viu um egípcio a golpear um escravo judeu, tentando matá-lo. Imediatamente Moshé salvou o judeu, matando o egípcio e escondendo o corpo na areia. Logo em seguida a Torá relata um incidente no qual Moshé viu dois judeus a brigarem, e quando um
levantou a mão para bater no outro, Moshé interveio e gritou "Rashá" (Malvado). Um dos homens, indignado com a intervenção, perguntou para Moshé "Quem te colocou por um homem, juiz e ministro sobre nós? Você me matará, como matou ao egípcio?" (Shemot 2:14). A Torá descreve que Moshé teve medo e falou "Certamente foi conhecido o assunto". A Torá
continua e diz que o Faraó, ao saber que Moshé havia morto um egípcio, enfureceu-se e tentou matá-lo, mas D'us salvou Moshé com um milagre e ele fugiu para Midian, onde ficou muitos anos, até que D'us se revelou a ele num arbusto ardente e o escolheu como o salvador do povo judeu.
Mas há algo estranho no relato sobre a briga dos dois judeus e a discussão deles com Moshé. Quando Moshé matou o egípcio, ele certificou-se, de que ninguém estava a observar. Então como mais alguém sabia?
Além disso, do que Moshé ficou com medo? Aparentemente ele teve medo de que o Faraó escutasse que ele havia morto o egípcio e tentaria se vingar, como realmente aconteceu. Então o que significa "Certamente foi conhecido o assunto"? Deveria estar escrito "Certamente será conhecido o assunto". A própria Torá descreve que somente depois disso o Faraó ficou sabendo. Então que medo era esse, e o que ficou conhecido?
Explicam os nossos sábios que na verdade Moshé não temia o Faraó, e o assunto que ficou conhecido não era sobre a morte do egípcio. Por muitos anos Moshé vinha-se questionando o porque D'us havia castigado o povo judeu de forma tão dura. O que havia de diferente no povo judeu, que fazia com que eles merecessem aquele sofrimento, e não algum outro povo? No momento que ele veio intervir na briga, um dos judeus que estava a brigar era justamente o judeu que ele havia salvo no dia anterior. Ao invés de agradecimentos, o judeu ameaçou denunciar Moshé ao Faraó, e realmente o fez. Neste momento Moshé entendeu tudo: havia Lashon Hará (mal uso do poder da fala) e delatores dentro do povo judeu, e certamente este havia sido o motivo pelo qual eles haviam sido escravizados. E por isso ele temeu, pois entendeu que esse também era o motivo pela qual a redenção não chegava e o castigo se tornava cada vez mais pesado.
É interessante notar que Moshé chamou um dos homens de Rashá apenas por ter levantado a mão ao seu companheiro, sem nem mesmo bater nele. Porquê? Pois alguém só levanta a mão contra o seu companheiro se aos seus olhos o outro não tem nenhum valor. Uma pessoa só pode golpear outra se no seu coração falta o mínimo de preocupação com o próximo. E esse é exactamente o mesmo motivo que leva as pessoas a fazer Lashon Hará do seu companheiro, pois quando nos preocupamos com o próximo, certamente não falamos mal dele.
A escravidão no Egipto foi a maneira que D'us utilizou para moldar o povo judeu, e Moshé entendeu que enquanto ainda houvesse Lashon Hará e desunião dentro do povo, não poderia haver redenção. E da mesma forma que Moshé entendeu que o exílio e os sofrimentos se prolongavam por causa do Lashon Hará, os nossos sábios ensinam que também o nosso exílio e o nosso sofrimento se prolongam por causa da nossa desunião e do nosso Lashon Hará. Somente quando cada um realmente se preocupar com o seu próximo, e de verdade querer o bem de todos, haverá menos Lashon Hará e os dias da nossa redenção finalmente chegarão.

Rav. Efraim Birbojm