16.10.06

Kipá o tempo todo














Desejo fazer uma confissão: Eu uso kipá, não somente na sinagoga, mas a tempo inteiro.
Até mesmo em situações sociais. Não costumava fazer isso antes. Na verdade, durante os primeiros 36 anos da minha vida, eu somente a usava na sinagoga. E mesmo assim era uma raridade.
O fenómeno da mudança de "kipá nunca" para "kipá todos os dias" é registado mais indelevelmente pelas reacções que se recebe dos amigos, família e colegas de trabalho. Estas reacções variam de "Por que está a usar isso? É algum tipo de feriado judaico outra vez?" a "Ele é um fanático!" até "Ele a usa para esconder a falta de cabelo no alto da cabeça!" (Eu gostaria de ter pensando nisso quando a minha careca ficou evidente pela primeira vez há quinze anos!)
Porém minha a reacção favorita e mais subtil veio de um colega cujos olhos dardejaram entre a minha kipá e eu pelo menos umas cinquenta vezes durante uma conversa de cinco minutos.
Um dilema marcante deste recém-descoberto "kipadismo" vem quando se confronta a primeira situação no trabalho usando o "tradicional boné judaico," como um colega de trabalho o descreveu. Isso envolve encontrar-se com alguém fora da sua actual empresa e portanto, fora do grupo que assistiu à sua transição gradual de indivíduo secular para religioso, e que fez todas as perguntas sobre as suas novas práticas e parece realmente interessado nas respostas.
Agora estou-me a aventurar para além da zona de segurança, até a fronteira final. Kipá ou não kipá? Esta era a questão.
Para mim, este "primeiro contacto" veio por ocasião de uma entrevista para um novo emprego. O que tornou tudo ainda mais difícil é que este era um emprego que eu realmente queria! Por outras palavras, havia muito em jogo, profissionalmente falando. Portanto, agora eu tinha que fazer uma opção. Não e necessário o uso da kipá para trabalhar se isso prejudicar o seu cargo de maneira negativa. Então, eu tinha um "álibi" se desejasse. Mas eu deveria aceitá-lo?
Sempre que tenho estas profundas dúvidas morais, consulto a minha mulher. Ela não apenas é mais inteligente e mais bonita do que eu, como também muito mais sábia. Como sempre, ela teve uma reacção brilhantemente perspicaz. "Bem," disse ela, "se estás com medo de que o teu chefe possa não gostar de judeus ou pessoas religiosas em geral, é melhor descobrires durante a entrevista do que depois de começar a trabalhar para eles."
E com isso, a decisão estava tomada. Eu usaria a kipá.

Testando o campo
Cheguei à entrevista alguns minutos adiantado e fui até ao sanitário dos homens para me olhar ao espelho. Eu parecia o mesmo das anteriores entrevistas de emprego, excepto pela adição circular no topo da cabeça. A minha kipá era de bom gosto, mas era também uma declaração. Uma GRANDE declaração. Portanto, de pé ali no sanitário, hesitei por um momento e pensei: "Ainda poderei tirá-la."
Mas então percebi que não usar a minha kipá seria uma declaração ainda maior. Uma declaração que negava aquele que sou. Um judeu. Um judeu religioso. Portanto, para mim, entrar sem uma kipá seria uma declaração de que sou menos que totalmente comprometido com aqueles ideais sobre os quais eu baseio a minha vida. Portanto, fui com a kipá de bom gosto e tudo.
O homem que me cumprimentou sorriu e apertou-me a mão. Nada de olhares indo da kipá para mim, nenhum queixo caindo até ao chão como ocorre nos desenhos animados. Simplesmente um simpático "Como vai?"
Logo no início da entrevista, ele perguntou-me: "Quais são as suas paixões?""No trabalho ou na vida em geral?" perguntei."Na vida em geral" - replicou ele.
Pensei por uma fracção de segundo. Eu deveria ser realmente honesto? Deveria contar-lhe o que realmente anima e motiva minha vida? Ou deveria eu dar-lhe a resposta padrão comercial que "um trabalho bem feito e sacrificar-me pela companhia é o que me faz vibrar"?
Optei pela primeira. Achei que, ora bolas, ele já tinha visto a kipá. Eu poderia ser franco. Vamos lá.
"As minhas paixões são D'us, família, comunidade e trabalho. Nesta ordem."
Tentei suavizar o golpe. "Provavelmente, não é bem isso que um gerente deseja ouvir! Mas não me entenda mal. Trabalho muito e levo o meu emprego a sério. É apenas uma questão de prioridades."
Esperei a sua reacção; qualquer sinal de choque ou desapontamento visível. Nada. Ele simplesmente sorriu e continuou a entrevista. "Quais são as suas paixões?"
Nós realmente nos demos bem, e o restante da entrevista foi óptimo. Mas eu não conseguia deixar de questionar-me sobre o que ele achara da minha resposta àquela primeira pergunta. Ao final da entrevista, ele indagou se eu tinha quaisquer perguntas a fazer.
"Somente uma" - disse eu. "Quais são as suas paixões na vida?"
(Quando mais tarde contei aos meus amigos que lhe perguntara isso, eles ficaram tão chocados como se eu tivesse perguntado se ele usava ceroulas.)
"Bem" - disse ele sorrindo. "É engraçado. Quando ouvi você responder àquela pergunta, senti como se estivesse ouvindo eu mesmo responder."Consegui o emprego pouco depois.

Tomar uma posição
No fim, ir à entrevista com uma kipá e responder as perguntas de maneira honesta mas não politicamente correcta não foi um ato heróico. Os meus sogros, que sobreviveram aos campos de concentração nazistas, o meu pai que voou em mais de cinquenta missões de combate durante a Segunda Guerra - estes foram os verdadeiros heróis.
Porém, a minha declaração fora corajosa. Defendi algo em que acreditava. Tornou-se claro para mim que, se sou um judeu religioso apenas em particular, então, o que sou, na verdade? Se jamais defendo algo, não represento nada.De facto, talvez tenha sido justamente pela minha kipá e pelas minhas palavras nas quais eu defendia alguma coisa, que eu tenha me destacado dos outros candidatos e conseguido o emprego.